domingo, janeiro 20, 2008

Era no ritmo alucinante da música que tocava insistentemente em seus ouvidos que ela olhava pela janela do ônibus, vendo as gotas da chuva baterem no vidro...as pessoas caminhavam na rua num movimento lento e displicente pensando em suas próprias vidas...

A cidade tinha desses repentes onde as pessoas pouco se importavam com as vidas dos outros...e as pessoas não sabiam de histórias, nem de contos...e não sabiam de sentimentos e sensações...ela podia pensar alto...que ninguém daria a mínima importância...afinal, a loucura vivia próxima de cada um, mas era mais fácil ignorar do que entender...

Lembrava-se da noite que passara dançando loucamente, colocando pelos seus poros tudo aquilo que tinha de ruim dentro de si...e tinha visto ali, no seu transe místico dois olhos belos que a acompanhavam insistente pelo local...

O corpo pingava um suor amargo com gosto de uma dor que insistia em querer lembrar...enquanto fechava seus olhos e sentia a vibração pulsar junto com seu coração, sabia que era necessário estar ali, pra despir seus medos e jogar tudo no chão...

Mas a noite tinha acabado no momento em que seus olhos se abriram...e lembrava que a semana ia ser cansativa como todas as outras...

Agora estava ali, de volta pra casa, sentada em um ônibus que começara a encher, cansada de seu dia de trabalho...

Era possível que todas aquelas pessoas se sentissem como ela...com suas histórias...com suas sensações...era possível que muitas delas colocassem suas frustrações pra fora de variadas maneiras...era possível que muitas delas agora estivesses tristes, alegres, cansadas, desanimadas, excitadas...

Resolveu descer no próximo ponto...queria descer, tomar chuva, correr...queria ser...enquanto andava na rua pisando nas poças que as pessoas desviavam apressadas, ouvia a voz da sua consciência dizendo que teria sido idiota se tivesse estragado sua vida...

O mundo continuaria magestoso, enquanto ela, estaria louca, presa dentro de suas próprias insignificâncias, e meia dúzia de seres humanos imbecis ririam de sua falta de bom senso...só comprovaria a todos eles que tinham conseguido destruir sua vida...

A mentira era realmente a pior praga que o mundo poderia inventar...se até Judas tinha mentido levando o filho do seu Deus a ser crucificado, o que um simples humano poderia fazer com mentiras contadas de maneira tão engenhosa?

Os humanos tem poderes que nem podem imaginar...e dentro dela tinha surgido uma força que ela não explicava...tinha vergonha de ter sido tão cega e tão obstinada em acreditar em mentiras...

Tinha vergonha de ter sido tão patética e tão frágil que não queria entender que estava certa, acreditanto que estava errada, pra se enganar pensando que tudo não passava de um pensamento ruim dentro de seu peito....

Quando parou em frente ao muro do mirante, a chuva caía em gotas grossas sobre seu rosto...seu corpo tinha a mesma sensação daquela noite e dentro de suas boas lembranças, sentia o sabor doce que aqueles belos olhos tinham deixado em seus lábios...

Sorria, pela primeira vez em semanas...sorria porque sabia que a liberdade não tinha preço...porque sabia que sentir era realmente inexplicável...porque a felicidade é genuína e depende somente da vontade de cada um...

Sorria porque sua alma retornava novamente em seu corpo...estava viva e nada mais poderia lhe atingir...

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