sábado, junho 10, 2017

Walk Away

- Tá doendo, tá? Será que vc não vê?

A mulher de cabelos longos vermelhos, olhava pra menina caída no chão. Sua expressão era sempre a mesma,os olhos eram de desprezo, principalmente quando era chamada pra essas ocasiões:

- Eu te avisei, um milhão de vezes, você não quis me escutar... E mais uma vez me chamou pra escutar o óbvio...

- Tu és a única pessoa que confio, sabes disso, mas mesmo assim, me ignora, ignora o fato que estou aqui lhe pedindo ajuda.

- Não ignoro, só acho que você vive batendo nessa mesma tecla. Se tá doendo, se cure. Não tem o que fazer. Não tem como melhorar.

- Não sei mais o que fazer, fiz de tudo, tudo o que você me disse. Segui todos os seus malditos conselhos e agora, tudo o que tenho é essa dor que não passa. Não há pílulas que curem, não há mais nada que posso fazer...

- Você sabe o que tem que fazer, só está querendo ouvir de mim pra ter a certeza de que não fará nada de errado...

- Eu não sei! Já lhe disse! Por que não me ouves?

- Você está falando comigo ou com sua consciência? Larga a mão de ser a adolescente perdida no mundo! Seu tempo já passou, agora é agir! Agir garota, nada mais! Mas você não presta atenção, fica nesses seus "e se isso... e se aquilo", acorde! Na vida não existe "e se..."

- Não consigo entender... Se não existe, por que a gente procura explicações pra tudo?

- Porque é confortável. Porque te faz sentir mais humana se pensar que sua vida é cheia de possibilidades. As possibilidades você mesmo que cria. A vida não corre atrás de você se você não vive.

- Mais do que eu tenho feito? Mais do que eu tenho entendido pacientemente a realidade que me tortura? Não é possível, tem que ter alguma solução mais plausível...

- Escute a você mesmo. Você quer que as coisas caiam do céu. Quer que as pessoas lhe entendam, gostem de ti, gostem da tua companhia, mas o que você faz pra merecer isso?

- Sou verdadeira, tu me ensinaste isso, esqueceu?

- Verdadeira... E por que fica aí, chorando que algo está te ferindo em vez de arrancar logo de uma vez o veneno que te consome todos os dias? A ferida tem que ser limpa, exposta, senão ela não cicatriza, não melhora nunca. Ficou aí batendo no peito, dizendo que estava finalmente curada, mas não tá. Tampou o buraco com uma gaze e deixou lá, sem cuidado nenhum... isso infecciona e tudo morre. Você e as mesmas inseguranças, mesmos medos, será que nunca vai aprender?

- Como não cuidei? Como não limpei e simplesmente tampei pra não ter que ver? Você estava aqui! Você viu, você viu tudo, viu tudo o que fiz e tudo o que tenho tentado fazer e agora você me vem com essa história? Hipócrita!

Uma expressão de raiva se criou no rosto pálido daquela mulher. Ela se abaixou lentamente e com o dedo apontado para o rosto da menina, disse entre os dentes, segurando seu instinto:

- Hipócrita? O que você sabe da vida, sua fedelha? Acha que se sou assim hoje, não tive que limpar todas as feridas que abriram pelo meu corpo? Que não tive muitas vezes que suportar a dor sozinha e calada, porque nunca tive alguém como você tem pra ouvir as suas estúpidas lamúrias? Sabe quantas cictrizes eu tenho? Quer que eu te mostre? Será que você conseguirá contá-las? Já disse e vou repetir, nada é fácil. Agora se você está a fim de desistir, problema seu. Não me culpe de seus erros. Não conte comigo da próxima vez...

Ela se levantou, virando suas costas a menina e começou a seguir seu caminho. Ainda caída no chão, as lágrimas pularam dos olhos da garota, e em um grito de desespero a chamou de volta, como seu último recurso. Estar sozinha era ruim, mas padecer e ficar sozinha pra eternidade era muito pior.

- NÃO! POR FAVOR! SE VOCÊ NÃO ME AJUDAR A NÃO DESISTIR, EU NÃO TENHO MAIS NADA! SERÁ QUE NÃO CONSEGUES ENTENDER QUE SÓ QUERIA OUVIR QUE TUDO VAI FICAR BEM?

A mulher parou e abaixou sua cabeça e os longos cabelos vermelhos caíram pelo seu rosto. De olhos fechados, teve um relance de sua humanidade.

- Achas que não tenho compaixão. Que gosto de lhe ver sofrer, de lhe ver nesse estado. Mas não sou. Eu sei o que você sente e sei que lá no final uma hora você irá se arrepender de deixar essa dor te dominar. Quero que sejas forte, porque nenhuma providência divina irá se derramar sobre tudo isso e fazer com que as coisas simplesmente dêem certo assim, sem esforço nenhum.

- Mas por que comigo?

- Porque tem que ser assim. Porque você sabe que consegue...

- Já não consigo mais. O fio da maldita sanidade irá se partir e aí, todo o meu esforço foi em vão.

- Você é mais forte que isso, eu sei, eu vejo, confie em mim.

Em meio a prantos, a menina escondeu sua face em vergonha de suas lágrimas, equanto a mulher se abaixava lentamente tocando em seus ombros e lhe dando um forte abraço:

- É hora de limpar a ferida

Daquele lugar não se pode ouvir os gritos, mas mais uma ferida se abriu, mais uma cicatriz se formou.

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