quinta-feira, setembro 14, 2017

"Depois da primeira ligação a Alice, eu abri uma porta pra um caminho sem volta. Eu fechei a mesma, tranquei com chave e a joguei por debaixo dela. Passados uns dois dias a liguei pra retornar ao estúdio e assim eu fui criando uma rotina, minha e dela.

Só dessa maneira é que aos poucos fui me aproximando de Alice. Fui deixando de me sentir um babaca ao lado dela e ela foi abaixando sua guarda com relação a nós dois.
Eu gostava de tê-la por perto e por 3 ou 4 noites por semana e ficávamos trabalhando até mais tarde. Ela vinha de madrugada, gravar alguma coisa ou simplesmente pra gente jogar conversa fora.
Eu ainda estava ficando em um hotel perto do estúdio e tinha voltado pra casa uma vez pra pegar algumas coisas. Não tinha ainda me encontrado com Claire e isso me fazia bem, porque não tinha que pensar. Ela não me procurava e eu não procurava ela.
Definitivamente a ideia de me separar da banda tinha ido embora e eu estava animado com o novo projeto. Alice ao longo dos dias ia me entendendo mais, não me deixando dúvidas que podia confiar nela.
Aquela sensação boa e aquele sorriso nos lábios sempre apareciam quando ela vinha e me contava algo sobre o seu cotidiano. Alice me contava que queria um dia fazer jornalismo porque achava que todo mundo teria que ter o direito de estudar em uma faculdade. Contava sobre como conheceu todos os seus amigos. Contava como Sam era praticamente um pai pra ela e que ela era muito grata por tudo o que tinha feito, já que se não fosse ele, ela não estaria trabalhando conosco.
Contava como Lex era seu irmão e tinha feito com que ela enfrentasse todas as dificuldades até ali. E eu prestava atenção em tudo o que ela dizia, sem desviar meu pensamento para nada mais.
Sempre que trabalhávamos até tarde, a levava em casa e quando ela ia pro curso, esperava ela pegar o ônibus que passava ali na frente.
Salvas as exceções, quando Mike estava presente, fechávamos juntos o estúdio. Ela sempre ria das loucas histórias que eu contava pra ela do que já tinha acontecido em minha vida.
Me sentia leve, livre. Um homem mais feliz ao lado dela. Aquela garota ia mudando a minha percepção de mundo e eu ia deixando me levar pelos seus cabelos quase loiros e o cheiro levemente doce de seu perfume.
Ansiava pelas madrugadas, assim como pelas caronas e pelos olhares e sorrisos que trocávamos no estúdio. Ela era especial e aquelas pequenas alegrias iam me bastando.
Mesmo Kevin pegando no pé dela, eu fazia de tudo pra ajudá-la. Obviamente sem que ninguém soubesse. Era nosso segredo e eu gostava de ter algo especial com ela. Me sentia menos enciumado de ver os meninos brincando com ela pelo estúdio ao longo do dia, porque eu sabia que em algum momento aqueles sorrisos seriam meus. Ou para mim, melhor dizendo.
Até que chegou o momento que ela não ia mais embora. Os meninos saíam, eu saía junto pra comprar algo pra gente comer e voltava pra dentro do estúdio, pra que ela não tivesse que voltar pra lá no meio da madrugada.
Eu a ajudava com as coisas, com a arrumação, até com as bizarrices que Kevin pedia, como por exemplo, polir suas guitarras. A gente continuava essas horas extras, sem que ninguém soubesse.
Alice ia me conhecendo, aos poucos, ia sabendo coisas sobre mim que poucas pessoas sabiam. Ia descobrindo outras até com poucas informações esparsas que eu dava a ela. Às vezes, só de cruzarmos os olhares no estúdio eu sabia o que ela pensava sobre determinado assunto que poderia ter surgido, do nada.
Ela era uma garota comum, que usava calças jeans e tênis, mas o brilho nos seus olhos era tão intenso, da mesma maneira que eram os seus sorrisos, que despercebidamente eu não conseguia mais me livrar de sua companhia. Eu não queria mais me livrar de sua companhia.
Ela brincava a todo momento comigo quando eu dizia que era velho, que eu tinha artrose e não tinha pique pra nada. E eu ria, simplesmente porque seu jeito de ser era o que tinha me acontecido de mais arrebatador até então."

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