quarta-feira, novembro 18, 2015

"Sai correndo e fui abrir o portão. Era ela. Estava sentada de costas, na calçada. Seus cabelos grudados uns nos outros, sua cabeça deitada sobre seus joelhos, abraçada nas pernas. Parecia enfraquecida. Me abaixei e toquei seu ombro pra não assustá-la.

‘Alice?’

‘Eu não consigo me levantar, me ajuda?’

Quando parei de frente pra ela, não a reconheci. Suas roupas pareciam largas, o rosto fino, os olhos fundos, pálida, abatida.

‘O que aconteceu?’ – e coloquei seus braços sobre os meus ombros, lhe levantando sem dificuldades – ‘consegue andar?’ – ela mal conseguia se manter de pé, seus olhos se abriam e se fechavam lentamente

‘Não, não consigo’ – ela falava com dificuldade

Lhe segurei no colo e a levei pra dentro, batendo o portão com o pé. Encostou sua cabeça em meu pescoço, parecendo mole, sem vida.

‘Você é muito bonito’ – ela disse passando seus lábios pelo meu pescoço, respirando com dificuldade

Coloquei Alice no sofá e me senti desesperado quando a vi sob a luz. Seu casaco estava molhado da chuva, os seus cabelos grudados e ela sem expressão, tremia.

‘Onde você estava?’ – lhe perguntei aflito

‘Não sei, sei que a vodca era boa, meus pés não doíam e eu não sentia frio, agora meus pés doem muito’

‘Quer que eu tire seu tênis?’

‘Quero’ – e ela caiu pra trás no sofá, sem aguentar ficar sentada

Quando tirei seu tênis, suas meias eram encharcadas de sangue e estavam grudadas na sola dos pés. Fiquei apavorado.

‘O que fez nos pés?’

‘Cai, na mesa, puf. Pisei nuns vidros, cortei os pés, os braços, a testa, ó’ – e me apontou pra um galo que tinha na cabeça

‘Suas meias, tem sangue, vou leva-la no médico’

‘Não Louis! Médico não, por favor! Não, não, médico, não. Ó, passou a dor, eu juro, passou a dor’ – e ela voltou a se sentar

‘Alice...’ – eu não sabia muito bem o que fazer

‘Deixa assim, vai passar, senta aqui do meu lado, eu sinto muito frio, muito frio...’ – sentei ao lado dela e suas roupas também estavam molhadas

‘Eu vou tentar limpar seus pés, posso?’

‘Médico não, por favor...’ – e ela encostou sua cabeça no meu peito, o cheiro de bebida começava a exalar dela

‘Não vou levar, eu prometo’ – o que diabos estava acontecendo?

‘Tudo gira. Quero vomitar’

Peguei Alice no colo novamente e a levei correndo até o meu banheiro. Quando a coloquei de pé no chão pra leva-la ao vaso sanitário, ela vomitou e caiu, se sujando toda.

‘Me desculpe...’ – ela falava tentando se levantar, meu coração doía, o que tinha acontecido com ela? Porque estava daquele jeito?

‘Eu vou te dar um banho, se importa?’ – eu me sentia constrangido, mas não podia deixa-la daquela maneira, toda suja

‘Não. Louis, me desculpe...eu não quero te atrapalhar’

Fui então tirando suas roupas sujas e jogando pelo chão e ela se cobria, tremendo de frio. Suas pernas e braços eram finos e eu podia contar suas costelas. Não me fazia lembrar nem de longe a última vez que a vi. Seu corpo tinham marcas roxas e arranhões espalhados. Seus pés tinham cortes profundos quando lhe tirei as meias grudadas. E quando a vi se cobrindo de vergonha de mim, tremendo, meu coração doeu.

‘Meu Deus’ – saiu da minha boca sem que eu percebesse

‘Eu sinto frio’ – ela disse sem olhar pra mim

‘Vou te dar um banho quente. Se apoia em mim’

Tirei a blusa que vestia, os tênis e de calças mesmo entrei com ela dentro do chuveiro. Coloquei Alice sentada no chão, ela parecia uma criança. Passei xampu em seus cabelos e creme, lhe tirando a sujeira de todo o corpo. Ela permanecia de olhos fechados, mal conseguia se mover, com a cabeça encostada na parede. Parecia doente, muito doente. Quis chorar quando lhe vi assim.

Quando terminei de lhe dar banho, enrolei-a numa toalha e lhe sequei, colocando roupas minhas, deitando ela na minha cama, de lado e lhe cobrindo com um cobertor.Fui até lá fora e peguei uns panos pra limpar o banheiro. Alice parecia ressonar quando passei pelo quarto. Enquanto limpava, pensava o que será que tinha acontecido com a minha menina."

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