"Depois da primeira ligação a Alice, eu abri uma
porta pra um caminho sem volta. Eu fechei a mesma, tranquei com chave e a
joguei por debaixo dela. Passados uns dois dias a liguei pra retornar ao
estúdio e assim eu fui criando uma rotina, minha e dela.
Só dessa maneira é que aos poucos fui me
aproximando de Alice. Fui deixando de me sentir um babaca ao lado dela e ela
foi abaixando sua guarda com relação a nós dois.
Eu gostava de tê-la por perto e por 3 ou 4 noites
por semana e ficávamos trabalhando até mais tarde. Ela vinha de madrugada,
gravar alguma coisa ou simplesmente pra gente jogar conversa fora.
Eu ainda estava ficando em um hotel perto do
estúdio e tinha voltado pra casa uma vez pra pegar algumas coisas. Não tinha
ainda me encontrado com Claire e isso me fazia bem, porque não tinha que
pensar. Ela não me procurava e eu não procurava ela.
Definitivamente a ideia de me separar da banda
tinha ido embora e eu estava animado com o novo projeto. Alice ao longo dos
dias ia me entendendo mais, não me deixando dúvidas que podia confiar nela.
Aquela sensação boa e aquele sorriso nos lábios
sempre apareciam quando ela vinha e me contava algo sobre o seu cotidiano. Alice
me contava que queria um dia fazer jornalismo porque achava que todo mundo
teria que ter o direito de estudar em uma faculdade. Contava sobre como
conheceu todos os seus amigos. Contava como Sam era praticamente um pai pra ela
e que ela era muito grata por tudo o que tinha feito, já que se não fosse ele,
ela não estaria trabalhando conosco.
Contava como Lex era seu irmão e tinha feito com
que ela enfrentasse todas as dificuldades até ali. E eu prestava atenção em
tudo o que ela dizia, sem desviar meu pensamento para nada mais.
Sempre que trabalhávamos até tarde, a levava em
casa e quando ela ia pro curso, esperava ela pegar o ônibus que passava ali na
frente.
Salvas as exceções, quando Mike estava presente,
fechávamos juntos o estúdio. Ela sempre ria das loucas histórias que eu contava
pra ela do que já tinha acontecido em minha vida.
Me sentia leve, livre. Um homem mais feliz ao lado
dela. Aquela garota ia mudando a minha percepção de mundo e eu ia deixando me
levar pelos seus cabelos quase loiros e o cheiro levemente doce de seu perfume.
Ansiava pelas madrugadas, assim como pelas caronas
e pelos olhares e sorrisos que trocávamos no estúdio. Ela era especial e
aquelas pequenas alegrias iam me bastando.
Mesmo Kevin pegando no pé dela, eu fazia de tudo
pra ajudá-la. Obviamente sem que ninguém soubesse. Era nosso segredo e eu
gostava de ter algo especial com ela. Me sentia menos enciumado de ver os
meninos brincando com ela pelo estúdio ao longo do dia, porque eu sabia que em
algum momento aqueles sorrisos seriam meus. Ou para mim, melhor dizendo.
Até que chegou o momento que ela não ia mais
embora. Os meninos saíam, eu saía junto pra comprar algo pra gente comer e
voltava pra dentro do estúdio, pra que ela não tivesse que voltar pra lá no
meio da madrugada.
Eu a ajudava com as coisas, com a arrumação, até
com as bizarrices que Kevin pedia, como por exemplo, polir suas guitarras. A
gente continuava essas horas extras, sem que ninguém soubesse.
Alice ia me conhecendo, aos poucos, ia sabendo
coisas sobre mim que poucas pessoas sabiam. Ia descobrindo outras até com
poucas informações esparsas que eu dava a ela. Às vezes, só de cruzarmos os
olhares no estúdio eu sabia o que ela pensava sobre determinado assunto que
poderia ter surgido, do nada.
Ela era uma garota comum, que usava calças jeans e
tênis, mas o brilho nos seus olhos era tão intenso, da mesma maneira que eram
os seus sorrisos, que despercebidamente eu não conseguia mais me livrar de sua
companhia. Eu não queria mais me livrar de sua companhia.
Ela brincava a todo momento comigo quando eu dizia
que era velho, que eu tinha artrose e não tinha pique pra nada. E eu ria,
simplesmente porque seu jeito de ser era o que tinha me acontecido de mais
arrebatador até então."
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